quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

O Esporte na concepção do brasileiro

Outro dia, estava treinando no campo do Clube do Exército e enquanto caminhava para pegar minhas flechas no alvo, um carro passou ao lado e o motorista gritou: "Vai trabalhar, vagabundo!" O interessante é que não foi a primeira vez que isso aconteceu, na vez anterior, me pouparam do vagabundo.

Na hora fiquei chateado, uma vez que sendo neto de calvinistas europeus, sempre foi muito cobrado a me dedicar com afinco ao trabalho. Entretanto, o fato revela características da nossa sociedade: o esporte ainda não é considerado uma atividade "útil" e o brasileiro ainda está engatinhando no espírito esportivo.

Mesmo depois de brasileiros terem brilhado em esportes não convencionais (no caso do Brasil os esportes não convencionais englobam todos os esportes diferentes do futebol), como é o caso do Guga no tênis, do Scheidt na vela, do Bob Burnquist no skate, o brasileiro não consegue reconhecer que a prática do esporte é um ato nobre e altruísta por parte do atleta, que muitas vezes não recebe um centavo para engrandecer a imagem do Brasil.

Quem pratica qualquer atividade esportiva, sabe que para um atleta chegar a um alto nível de desempenho, são necessários anos de prática diária dedicada, sendo isso muito diverso da atitude de um vagabundo. O papel do atleta é extremamente útil para a sociedade como um todo, o atleta muda o nível de energia das pessoas que estão ao seu redor, disseminando boas práticas de saúde, de alimentação e de respeito.

A prática esportiva em organizações tem impactos profundos no grau de saúde dos indivíduos envolvidos. Melhor saúde implica em redução de gastos. Uma sociedade fisicamente ativa é uma sociedade mais saudável, mais eficiente. Acredito que seria desejável que o investimento do governo brasileiro nos esportes fosse maior, como uma aposta em uma sociedade melhor.

Quanto ao espírito esportivo ainda pouco desenvolvido, não é muito difícil arrumar exemplos de maus comportamentos: as brigas de torcidas no futebol são lugares comuns; me lembro de uma Copa Davis que fui assistir em que um tenista uruguaio interrompeu o saque várias vezes por causa da gritaria da torcida; na final do NBB do ano passado, a torcida de Brasília apresentou um triste espetáculo saindo no braço com alguns jogadores do Flamengo.

O atleta é o artista e o seu palco é o campo, a quadra, o tatame... o espectador deveria se resumir a aplaudir e se quiser influenciar os resultados, deve começar a praticar esporte seriamente. 

Um comentário:

  1. Pois é, Luis, vivo situações semelhantes dentro da Universidade. O esporte no meio acadêmico é tratado com preconceito e desrespeito, tanto por discentes como por docentes.
    É como se fosse uma atividade alienada, destinada apenas àqueles que não têm oportunidades de estudo, é tratado quase que uma antípoda do trabalho intelectual e, por isso, tão desrespeitada neste meio.
    Como no nosso caso, um esporte individual, pouco conhecido e "caro", acredito que as críticas sejam ainda mais vorazes.
    Já vivi situações em que tive de apresentar argumentos legais para que professores permitissem 2ªchamada de provas que havia faltado por estar competindo.
    A mais marcante para mim foi quando faltei uma prova de Política, pois estava em Guadalajara competindo pela seleção e a professora queria que a prova valesse apenas 50% da nota estipulada a princípio.
    Tive de arguir na frente de 40 alunos, com a lei que garante direito de reposição nas mãos e com o enorme desapontamento com nosso sistema universitário. Frente a tão embaraçosa situação, um amigo, atleta de judô, endossou meu argumento e por fim consegui fazer a prova com pontuação integral.
    Nos meus dois anos de curso, apenas um professor colaborou, me incentivou a treinar, se interessou pelo esporte e por acaso, ele é argentino.
    Cabe a nós, individualmente, enfrentarmos um sistema de ensino falho para poder treinar com mínimo de seriedade?

    Frente a tantas dificuldades enfrentadas por alunos/atletas, me questiono o real interesse dos organizadores do "Master Plan 2016".
    Se querem dedicação total dos atletas, por que então o argumento de que o centro de treinamento estará numa cidade que oferece ótimas condições de estudo? Temos consciência de que treino profissional e estudos sérios não cabem na mesma página.
    É um tanto quanto paradoxal.

    Ótimos textos, Luis, bom trabalho.
    Tamille

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